quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

CIRCUNSTÂNCIAS ESPIRITUAIS NA VIDA DA IGREJA

Leitura Bíblica: Cântico dos Cânticos, 3:1-11

Introdução

A Igreja vive dentro de circunstâncias comuns à humanidade: humilhação e honras, fartura e fome, abundância e escassez, desânimo espiritual e grande alegria no Senhor. Que variadas circunstâncias temos que experimentar: (veja Fl.4:10-13). Mas, às vezes, parece que os tempos negativos são mais numerosos do que aqueles de alento. Cristo nos advertiu: “No mundo, passais por aflições; mas tende bom ânimo; eu venci o mundo” Jo.16:33. Por que temos que passar por esses tempos negativos? O Apóstolo ensina que essas provações têm uma ação benéfica, pois podem confirmar e fortalecer a nossa fé. “Meus irmãos, tende por motivo de toda alegria o passardes por várias provações, sabendo que a provação da vossa fé, uma vez confirmada, produz perseverança. Ora, a perseverança deve ter ação completa, para que sejais perfeitos e íntegros, em nada deficientes” Tg.1:2-4. Esta confirmação da nossa fé é de suma importância, pois nos encaminha para uma maturidade mais expressiva e um procedimento mais estável e íntegro. O Ap. Pedro nunca se cansava de testemunhar do gozo espiritual que temos em Cristo Jesus, a quem não havendo visto, amamos; no qual não vendo agora, mas crendo, exultamos com alegria indizível e cheia de glória, obtendo o fim da nossa fé: a salvação da nossa alma, 1 Pe.1:8-9.

O terceiro capítulo se divide em três partes: Na primeira, a Igreja descreve a sua experiência negativa quando negligenciou os meios da graça, e como reagiu quando descobriu que Cristo tinha se afastado dela. Ela tomou uma decisão para buscá-lo com diligência, fez perguntas sobre a sua habitação, e, depois de várias experiências, achou-o e logo se agarrou a Ele. A segunda parte é a voz dos interessados, que, ao observarem a mudança no procedimento dos fiéis da Igreja, queriam explicações sobre aquele que tem poder para mudar as atitudes das pessoas de uma forma tão marcante. E, na terceira parte, a Igreja descreve as sublimidades majestosas de Cristo.


1. A Experiência da Igreja, Vs.1-5

É muito importante reenfatizar que a presença de Cristo com a sua Igreja, no sentido de desfrutar de uma vida em constante comunhão espiritual com Ele, não é algo inconsciente e independente de circunstâncias pessoais. É possível apagar o ministério do Espírito Santo em nossa vida quando deixamos de ouvir e atender ao que Ele está dizendo às Igrejas mediante a leitura das Escrituras Sagradas; e, quando isto acontece, Ele retira de nós o seu testemunho de paz com Deus. Semelhantemente, quando assumimos outras prioridades, a ponto de negligenciarmos a nossa comunhão espiritual com Cristo e o devido uso dos meios da graça, Ele também retira de nós a sensibilidade da sua presença. O Apóstolo adverte: “Tende cuidado, irmãos, jamais aconteça haver em qualquer de vós perverso coração de incredulidade que vos afaste do Deus vivo” Hb.3:12. A manifestação prática da incredulidade não é uma negação formal da fé, antes, é a negligência do uso diário dos meios da graça, tais como a leitura atenciosa das Escrituras Sagradas e a oração perseverante.

a) A desatenção da Igreja, V.I. “De noite no meu leito, busquei o Amado de minha alma, busquei-o e não o achei”. Neste versículo, há três momentos que descrevem a desatenção da Igreja: em vez de estar em pé, vigiando pelo bem de sua vida espiritual, ela estava prostrada no seu leito; contudo, a consciência dela começou a preocupá-la e, por isso, resolveu buscar o Senhor, mas, de uma maneira desatenciosa, sem o devido preparo de seu coração, pois continuou deitada no seu leito. E qual foi o resultado desta falta de seriedade? Deus não aceita irreverência e não ouve palavras desatenciosas, apesar de a Igreja ter buscado o Senhor, ela não o achou. 

O fato de estar prostrada no seu leito, de noite, e sem uma comunhão sensível com Cristo, sugere que a Igreja estava passando por mais uma crise espiritual. A noite é o tempo de desorientações e de trevas, quando não há nenhuma luz espiritual para alentar a alma abatida. Por que a Igreja caiu neste estado? Prostrada no leito é uma posição de inatividade, ou seja, de negligência da leitura das Escrituras e da oração persistente. Cristo recomendou: “Vigiai, pois, a todo tempo, orando, para que possais escapar de todas estas coisas que têm de suceder e estar em pé na presença do Filho do homem” Lc.21:36. Em nossa leitura, a Igreja, evidentemente, não estava vigiando, e nem estava em pé; estava deitada no seu leito, em plena negligência dos meios sustentadores da graça de Deus.

Mas o Espírito Santo jamais deixará o seu povo continuar neste estado de inércia; Ele age para que a Igreja seja logo restaurada à plena comunhão espiritual com Cristo. E, de fato, a Igreja foi movida a buscar a face do Senhor. Porém, permaneceu no seu leito. Possivelmente, pensou: uma pequena oração vai agradar a Deus; afinal, a Bíblia promete que o seu povo será ouvido quando clamar ao Senhor (Sl.55:16-17). A presunção espiritual é um verdadeiro perigo, porque assume que Deus ouvirá a oração, independente de circunstâncias morais. Qual é o caminho normal para invocar o nome do Senhor? Devemos preparar o coração através da leitura atenciosa das Escrituras, a fim de discernir o que Deus requer de nós. Munidos com o conhecimento da vontade de Deus, teremos condições para orar de acordo com o seu prazer. “E esta é a confiança que temos para com Ele; que, se pedirmos alguma coisa segundo a sua vontade, Ele nos ouve. E, se sabemos que Ele nos ouve, quanto ao que lhe pedimos, estamos certos de que obtemos os pedidos que lhe temos feito” 1 Jo.5:14-15.

Qual foi o resultado desta oração feita sem a devida espiritualidade? “Busquei-o e não o achei”. Certamente a Igreja se sentiu decepcionada com Deus quando Ele não ouviu a sua oração. Porém, temos que reconhecer que Deus não vai abençoar as nossas atividades quando elas são realizadas de uma maneira displicente. E, da mesma forma, Deus não vai ouvir pedidos pronunciados sem o necessário preparo espiritual. Em todo o nosso procedimento, Deus pede de nós a devida reverência e conformidade à sua vontade a fim de alcançarmos a bênção que lhe pedimos. A palavra do Apóstolo é mui oportuna para cada membro da Igreja: “Desejamos, porém, continue cada um de vós mostrando, até ao fim, a mesma diligência para a plena certeza da esperança; para que não vos torneis indolentes, mas imitadores daqueles que, pela fé e pela longanimidade, herdam as promessas” Hb.6:11

b) A decisão da Igreja, V.2. “Levantar-me-ei, pois, e rodearei a cidade, pelas ruas e pelas praças; buscarei o Amado da minha alma. Busquei-o e não o achei”. O primeiro versículo terminou com uma resposta negativa, pois, apesar de ter buscado a Cristo, a Igreja não o achou. Mas, para o nosso encorajamento espiritual, ela não deixou que esta desorientação desviasse o seu propósito para ter um verdadeiro encontro com o seu Amado. E, para demonstrar a seriedade de seu anseio, tomou esta decisão: “Levantar-me-ei, pois, e rodearei a cidade”. Aqui, a cidade, juntamente com as suas ruas, praças e guardas, simboliza a Igreja institucional, regularmente estruturada. Cristo, normalmente, pode ser encontrado andando no meio do seu povo, porém, nem sempre, porque neste caso, Ele não foi achado, e assim, seus fiéis ficaram, mais uma vez, desapontados.

Qual foi o efeito deste desapontamento sobre a atitude da Igreja quando descobriu que tinha perdido a sua comunhão com Cristo? Ela caiu em si ao reconhecer que Cristo tinha se retirado dela, e, assustada, logo tomou uma decisão mais séria: Não vou continuar nesta indolência vergonhosa, levantar-me-ei e buscarei o Senhor até o achar. Todas as nossas decisões têm que ser acompanhadas por uma ação apropriada. O filho pródigo, em seu estado de miséria, tomou esta decisão: “Levantar-me-ei, e irei ter com meu pai”. E, logo em seguida, transformou a sua decisão em movimento: “E, levantou-se, foi para seu pai”. Lc.15:11-24. A Igreja logo obedeceu a esse princípio.

Ao se levantar, ela se dirigiu ao local onde o povo de Deus se congrega e desfruta de uma comunhão espiritual com o seu Senhor. Certamente, ouviu a exposição das Escrituras Sagradas, participou das orações públicas, contudo, não experimentou o almejado encontro com Cristo. Por que ela não o achou através dos meios da graça de Deus? O ministério público da Igreja visível não tem poder para conduzir ninguém a um encontro salvífico com Cristo, porque esta é da exclusiva competência do Espírito Santo. A atividade principal da Igreja visível é declarativa, proclamando a vontade de Deus como se encontra nas Escrituras Sagradas. Portanto, o dever essencial do ouvinte da Palavra de Deus é ouvi-la atenciosamente, e, pela fé, agir de acordo com as instruções recebidas.

A confissão triste da Igreja: “Busquei o Amado da minha alma. Busquei-o e não o achei”. Por que Cristo não se apresentou logo à sua Igreja, quando ela o estava buscando com renovada diligência? Em primeiro lugar, devemos lembrar que Ele é o soberano Senhor do universo e não um escravo particular que vem correndo no momento em que ouve um clamor. Convém lembrar que a Igreja ficou deitada no seu leito em plena negligência de seus compromissos espirituais, e, em sua presunção pecaminosa, acreditou: Posso ficar deitada por mais um tempo, e, quando estiver disposta, invocarei o seu nome, e Ele certamente me receberá de boa vontade e sem demora. Cristo, como prudente construtor, pode protelar as suas vindas a fim de corrigir nossas tendências presunçosas. Ele é o Senhor, e nós, os servos. Por isso, Ele mesmo determina as suas ministrações: “Terei misericórdia de quem me aprouver ter misericórdia e compadecer-me-ei de quem me aprouver ter compaixão” Rm.9:15 Em segundo lugar, devemos entender que Ele, às vezes, não responde a nossa oração logo de início porque está querendo descobrir a verdadeira natureza da nossa fé. A história da mulher Cananéia é muito instrutiva neste sentido. Após receber vários “nãos” da parte do Senhor, ela insistia em fazer o seu pedido conhecido. “Então lhe disse o Senhor: Ó mulher, grande é a tua fé! Faça-se contigo como queres” Mt.15:21-28. Independente das circunstâncias do momento, o nosso dever é orar sempre e nunca esmorecer, Lc.18:1. Por isso, apesar de ter recebido mais um desapontamento, a Igreja não esmoreceu.

c) O desejo da Igreja, V.3. “Encontraram-me os guardas, que rondavam pela cidade. Então lhes perguntei: Vistes o Amado da minha alma?” A Igreja continua sentindo as ferroadas da tristeza, porque percebeu que perdera aquela comunhão sensível com Cristo. Ela o buscou quando deitada no seu leito, mas não o achou; levantou-se e o buscou através do ministério público da Igreja visível, e, mais uma vez, não o achou. Contudo, não caiu no desespero. Somos, de fato, “guardados pelo poder de Deus, mediante a fé, para a salvação preparada para revelar-se no último tempo” 1 Pe.1:5. Certamente, em seu desejo de encontrar-se com seu Amado, ela começou a rememorar aqueles bons tempos de outrora, quando, no meio da multidão, ia à Casa de Deus entre gritos de alegria e louvor. E, com tais lembranças, ela faz uma pergunta a si mesma: “Por que estás abatida, ó minha alma? Por que te perturbas dentro em mim?” E ela mesma responde: “Espera em Deus, pois ainda o louvarei, a ele, meu auxílio e Deus meu” Sl.42:4-5. Evidentemente, ela ainda estava se demorando ás portas da Igreja visível, quando os guardas, no exercício de seu ministério, a encontraram.

O que chama o nosso interesse é a diligência destes homens; eles logo discerniram a tristeza e a necessidade da Igreja, porque são os ministros da Palavra de Deus e os pastores das ovelhas. Eles são os nossos guias, comissionados por Deus para nos ajudar em nossa caminhada rumo às moradas eternas. Pastores fiéis, que apascentam com “conhecimento e inteligência”, que trabalham “segundo o coração de Deus”, são os dons de Deus para o aperfeiçoamento da Igreja, Jr. 3:15; Ef.4:7-14. Portanto, devemos orar diariamente por eles, porque “velam por nossa alma” Hb.13:17-18.

Estes pastores, vendo a tristeza e o desalento da Igreja, evidentemente lhe fizeram uma pergunta, a qual ela logo respondeu com outra pergunta: “Vistes o Amado da minha alma?” É importante observar como a Igreja se refere a Cristo; Ele é sempre o Amado da sua alma. Podemos passar por tempos de distração, o nosso amor para com Ele pode perder um pouco de seu ardor quando passamos por dificuldades espirituais, porém, ele jamais se apaga naquele que é realmente nascido de novo. O nosso amor para com Cristo sempre depende de seu amor para conosco: “Nós amamos porque ele nos amou primeiro” 1 Jo.4:19. Por isso, o nosso amor para com Cristo nunca desaparecerá, porque aquele que nos amou primeiro é o mesmo que começou uma boa obra em nós, e temos certeza de que Ele há de completá-la até o Dia Final, Fl.1:6. Contudo, o nosso dever é andar em amor como também Cristo nos amou, Ef.5:2. O Ap. Paulo fez esta oração em favor dos Tessalonicenses: “Ora, o Senhor conduza o vosso coração ao amor de Deus e à constância de Cristo” 2 Ts.3:5.

d) O deleite da Igreja, V.4. “Mal os deixei, encontrei logo o Amado da minha alma; agarrei-me a Ele e não o deixei ir embora, até que o fiz entrar em casa de minha mãe e na recâmara daquela que me concebeu”. A cena, de repente, muda: a Igreja achou o Amado de seu coração! Eis o motivo do deleite da Igreja: achou o Amado e está desfrutando de uma comunhão sensível com Ele. E isto aconteceu não através das ministrações da Igreja visível, e nem pela virtude dos pastores, então, como podemos explicar este caso? Comunhão espiritual é algo exclusivo entre Cristo e seu povo. É Ele que tem a prerrogativa para se manifestar à sua Igreja, segundo e seu beneplácito. Existe uma tendência de buscar um encontro com Cristo confiando na suposta eficácia dos meios físicos e visíveis que a Igreja institucional oferece, tais como o Batismo e a Ceia do Senhor. Estes Sacramentos, porém, não têm vida própria, portanto, são incapazes de realizar o que pertence à exclusiva soberania divina. O Ap. Paulo entendeu esta verdade, testemunhando: “Quando, porém, ao que me separou antes de eu nascer e me chamou pela sua graça (no caminho para Damasco, At.9:1-19), aprouve revelar seu Filho em “mim” Gl.1:15-16. Mas, em termos acessíveis, como é que a Igreja descobriu esta comunhão espiritual com Cristo? Possivelmente, os pastores, exercendo o seu ministério declarativo, indicaram-lhe a oração perseverante. Cristo nos deu esta orientação: “Tu, porém, quando orares, entra no teu quarto e, fechada a porta, orarás a teu Pai, que está em secreto; e teu Pai, que vê em secreto, te recompensará” Mt.6:6. O Ap. Paulo foi atendido, “pois ele estava orando” At.9:11.

Ana, a mãe do profeta Samuel, foi ouvida quando derramou a sua alma perante o Senhor, 1 Sm.1:15. O caminho é o mesmo para qualquer pessoa que procura um encontro (ou reencontro) com Cristo. Ele mesmo convida: “Vinde a mim (não aos meios físicos e visíveis que a Igreja institucional oferece), todos os que estais cansados e sobrecarregados, e eu vos aliviarei. Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração; e achareis descanso para a vossa alma. Porque o meu jugo é suave, e o meu fardo é leve” Mt.11:28-30. Bênçãos espirituais são encontradas somente na Pessoa de Jesus Cristo.

I) O encontro feliz com o Amado. “Mal os deixei (os guardas, ou, os pastores), encontrei logo o Amado da minha alma”. Cristo nos deu esta direção: “Pedi, e dar-se-vos-á; buscai e achareis; batei, e abrir-se-vos-á” Mt.7:7-8. Apesar de, às vezes, perdermos nossa comunhão sensível com Cristo, Ele não está longe de seu povo, pois nos vigia “detrás da nossa parede, olhando pelas janelas, espreitando pelas grades” Ct.2:9. Apesar de desapontamentos na busca de seu Amado, apesar de demoras em ser atendida, ela perseverou, e o achou. Podemos sentir o calor de sua exclamação triunfante: “Encontrei logo o Amado da minha alma!”

II) O agarramento ao Amado. “Agarrei-me a Ele e não o deixei ir embora”. À semelhança de Maria Madalena, no dia da ressurreição, a Igreja abraçou os pés de Jesus e o adorou, Mt.28:9. Este agarramento era tão forte que Jesus tinha que lhe pedir: “Não me detenhas; porque ainda não subi para meu Pai” Jo.20:17. A frase: “agarrei-me e não o deixei ir embora”, sugere um tipo de luta espiritual. O Amado, querendo se afastar outra vez, não podia, porque a Igreja o prendeu, não o deixando ir embora. Temos um exemplo notável desta luta espiritual no Livro de Gênesis: Jacó estava passando por uma crise emocional e espiritual. Ele se lembrava da ameaça de seu irmão de matá-lo por causa da bênção que ele lhe roubara. E, agora, Esaú estava chegando ao seu encontro, munido com quatrocentos homens. Jacó ficou amedrontado. Fez passar adiante toda a sua família e todos os seus bens, ficando ele só, a fim de ter um encontro salvífico com Deus, que, na realidade, foi uma luta espiritual, pois o texto registra: “E lutava com ele um homem (uma teofania de Deus), até ao romper do dia”. Nessa altura, o Homem lhe disse: “Deixa-me ir, pois já rompeu o dia”. Mas Jacó, desesperado, lhe respondeu: “Não te deixarei ir se me não abençoares” - fazendo com que Esaú tenha compaixão de mim. E Deus atendeu a sua súplica e o abençoou, acrescentando: “Já não te chamarás Jacó (aquele que agarra, ou, aquele que suplanta, pois, “segurava com a mão o calcanhar de Esaú, Gn.25:26) e sim Israel (aquele que luta, Os.12:2-4), pois como príncipe lutaste com Deus e com os homens e  prevaleceste” Gn.32:22-32. Este tipo de agarramento, através do qual a Igreja se relaciona com Cristo, indica a intensidade de seu amor e a ousadia da sua fé. Um amor que exclama: “Amo o Senhor, porque ele ouve a minha voz e as minhas súplicas” Sl.116:1. É uma fé que declara: “Sei em quem tenho crido e estou certo de que ele é poderoso para guardar o meu depósito (a minha alma para receber a eterna salvação) até aquele dia” 2 Tm.1:12. O segredo da nossa comunhão espiritual está nas palavras de Cristo: “Permanecei em mim, e eu permanecerei em vós, (...) porque sem mim nada podeis fazer” Jo.15:4-5. 

III) O que a Igreja fez com o seu Amado. “E não o deixei ir embora, até que o fiz entrar na casa de minha mãe e na recâmara daquela que me concebeu”. Neste versículo, “mãe” se refere à nação de Israel, a Igreja visível do Antigo Testamento; a nação rebelde que correu atrás de outros amantes, Os.2:1-5. Por causa destas vacilações morais e espirituais, ela é a mãe de uma multidão mista; tendo filhos da promessa e regenerados pelo poder imediato do Espírito Santo; e filhos da carne, que não têm compromisso diante de Deus e não são regenerados pelo Espírito Santo. Pesa sobre o coração de todos aqueles que têm experimentado um verdadeiro encontro salvífico com Cristo a necessidade de testemunhar acerca da sua experiência. Em nosso texto, sentimos uma urgência. Todos da casa da minha “mãe” precisam ouvir do meu encontro com o Senhor Jesus. Quando o gereseno foi curado, ele quis entrar no barco com o Senhor: “Jesus, porém, não lhe permitiu, mas ordenou-lhe: Vai para tua casa, para os teus. Anuncia-lhes tudo o que Senhor te fez e como teve compaixão de ti. Então, ele foi e começou a proclamar em Decápolis tudo o que Jesus lhe fizera; e todos se maravilhavam” Mc.5:1-20. O nosso testemunho não precisa ser um discurso teológico, basta falar da bênção que Cristo trouxe à nossa vida. E aqueles que nos ouvirem, e, verificando a mudança irrepreensível em nosso procedimento, também se admirarão. O nosso primeiro campo missionário deve ser a nossa própria casa e a Igreja local, no meio das pessoas que nos conhecem. Por isso, somos exortados: “Não deixemos de congregar-nos, como é costume de alguns; antes, façamos admoestações e tanto mais quanto vedes que o Dia (do Juízo Final) se aproxima” Hb.10:25. Quando nós somos achados fiéis neste dever mínimo, Deus poderá nos chamar para exercer um ministério maior e mais abrangente.

e) O desafio da Igreja, V.5. “Conjuro-vos, ó filhas de Jerusalém, pelas gazelas e cervas do campo, que não acordeis, nem desperteis o amor, até que este o queira”. O testemunho foi dado “em casa da mãe” e, agora, é a vez das “filhas de Jerusalém” receberem uma palavra de exortação. Estas “filhas” são os membros descomprometidos da Igreja visível. Porém, à semelhança das virgens na parábola que Cristo contou, as néscias têm um certo prazer em conviver no meio das prudentes, por causa dos privilégios de um ambiente mais aprazível. Mas esta mistura de crentes com descrentes provoca muitas das contendas internas que prejudicam o testemunho da Igreja institucional. Até certo ponto, estas “filhas” são as “raposinhas” que “devastam os vinhedos” que pertencem ao Senhor. Quando Israel saiu do Egito, “subiu com eles um misto de gente”, pessoas que não pertenciam ao povo de Israel, tais como os escravos comprados por dinheiro, estrangeiros e os assalariados, Ex.12:38,44,45. A Bíblia registra que este “populacho” que estava no meio do povo de Deus era o responsável pelas murmurações e as revoltas contra Moisés, Ex.11:4. A liderança da Igreja não tem competência para determinar, em termos finais, quem é crente verdadeiro e quem não é. Então, qual a responsabilidade da liderança? Cristo respondeu esta pergunta na parábola do Joio: “Deixai-os crescer juntos até a colheita, e, no tempo da colheita, direi aos ceifadores: Ajuntai primeiro o joio, atai-o em feixes para ser queimado; mas o trigo, recolhei-o no meu celeiro” Mt.13:30.

Por causa da influência negativa destas “filhas”, elas recebem este forte apelo: “Conjuro-vos, ó filhas de Jerusalém, pelas gazelas e cervas do campo, que não acordeis, nem despertais o Amor até que este o queira”. O uso do “conjuro”, invocando estes animais (conhecidos por sua rapidez de ação) é um apelo que não permite nenhum tipo de protelação; estas “filhas” têm que abandonar seus maus costumes e têm que se esforçar para viver mais conforme os ensinos da Igreja, para que Cristo não seja incitado a, novamente, retirar a sua presença abençoadora. Lembrando que, como já foi mencionado anteriormente (essa invocação é feita no capítulo 2, versículo 7 e, agora, novamente, no capítulo 3, versículo 5), Cristo é totalmente soberano em suas visitações especiais à sua Igreja (“até que este o queira”); é Ele quem toma a mão dela e a leva à sala de banquetes. O Apóstolo também usou o “conjuro” para reavivar em Timóteo um senso de responsabilidade para exercer o seu ministério com maior diligência. À luz deste “misto de gente que freqüenta o ministério da Igreja institucional, qual é a responsabilidade dos mestres de ensino? Eles têm a mesma incumbência de Timóteo: “Conjuro-te, perante Deus e Cristo Jesus, que há de julgar vivos e mortos, pela sua manifestação e pelo seu reino: Pregue a palavra, insta, quer seja oportuno, quer não, corrige, repreende, exorta com toda longanimidade e doutrina” 2 Tm.4:1-2. Outro motivo para “anunciar todo o desígnio de Deus” foi realçado pelo Ap. Paulo: Quem sabe, ó pregador do evangelho, se salvarás algumas destas “filhas de Jerusalém?; At.20:26-27; 1 Co.7:16. Afinal, as conversões geralmente acontecem entre aqueles que freqüentam e ouvem a pregação da Palavra de Deus.

2. A Pergunta das Filhas de Jerusalém, V.6

Estas “filhas de Jerusalém” acabaram de ouvir a exposição das Escrituras Sagradas. Evidentemente, o assunto foi o que Cristo faz na vida daqueles que nele crêem. As “filhas” se lembravam de quando a Igreja passou por um “deserto” espiritual, sem a presença sensível e vivificante de Cristo. E, agora, estão vendo a Igreja numa fase bem mais expressiva e feliz, pois está agarrada aos pés do Amado, recebendo toda sorte de bênção espiritual, Ef.1:3. Estas mesmas “filhas” costumavam menosprezar a parte zelosa da Igreja visível, por causa de suas “queimaduras”, as suas imperfeições. Mas, depois de ouvir estes novos esclarecimentos sobre a obra de Cristo e como Ele embeleza o seu povo, as “filhas”, meio incrédulas, porém, despertadas, perguntam: “Que é isto que sobe do deserto, como colunas de fumaça, perfumado de mirra, e de incenso, e de toda sorte de pós aromáticos do mercador?” Como pode algo tão belo emergir do “deserto”, onde não há nada vivo que possa facilitar mudanças tão visíveis? Quando os méritos de Cristo são aplicados ao pecador, transformações acontecem. As “filhas de Jerusalém” estão maravilhadas com a mudança que a Igreja está revelando agora, tão diferente do estado anterior. De fato, a verdadeira beleza da Igreja é uma obra monumental da eficácia e poder de Cristo. Podemos observar as três descrições do embelezamento da verdadeira Igreja.

a) A Igreja “sobe do deserto como colunas de fumaça”. Para se ter fumaça, é evidente que há fogo embaixo. A visibilidade da verdadeira Igreja é produzida pelo fogo do Espírito Santo que arde dentro dela. Deus “nos salvou mediante o lavar regenerador e renovador do Espírito”, portanto, o crente de fato é uma pessoa regenerada e renovada em seu modo de pensar. Enfim, é uma nova criação, por isso, as coisas pecaminosas do homem natural já foram abandonadas e um novo estilo de vida foi adotado, uma vida conforme a imagem de Cristo Jesus. Eis a fonte da sua beleza, Tt.3:5; 2 Co. 5:17; Rm.8:29.

b) Além de ser regenerada e renovada em seu modo de pensar, a verdadeira Igreja “perfumada de mirra, e de incenso, e de toda sorte de pós aromáticos do mercador”, isto é, dotada com toda sorte de bênção espiritual, tais como: o poder para viver uma vida santa e irrepreensível; a adoção de filhos; a redenção; a libertação do domínio do pecado; a remissão dos pecados; iluminação espiritual; o privilégio de sermos feitos herança; o direito de desfrutar de todos as bênçãos que acompanham a salvação; e o dom do Espírito Santo da promessa, o qual é o penhor da nossa herança, Ef.1:3-14.

c) Cada um destes privilégios foi adquirido por preço, um preço altíssimo, a fim de que sejam entregues gratuitamente aos redimidos. O Ap. Paulo confessou: “Vivo pela fé no Filho de Deus, que me amou e a si mesmo se entregou por mim” Gl.2:20. O Ap. Pedro, meditando sobre este preço, escreveu: “Sabendo que não foi mediante coisas corruptíveis como prata ou ouro, que fostes resgatados do vosso fútil procedimento que vossos pais vos legaram, mas pelo precioso sangue, como de cordeiro sem mácula e sem defeito, o sangue de Cristo” 1 Pe.1:18-19. Bem podem as “filhas de Jerusalém” exclamar atônitas: “Que é isto que sobe do deserto?” Uma beleza  singular que surge de um lugar tão inóspito e improvável! De fato, a Igreja, comprada por Cristo, “é gloriosa, sem mácula, nem ruga, nem coisa semelhante, porém, santa e sem defeito” Ef.5:27. E, qual o propósito de Deus nesta atividade salvífica? “A fim de sermos para louvor da sua glória” Ef. 1:12.

3. A Resposta que a Igreja deu. Vs.7-11

No V.6, as “filhas de Jerusalém” ficaram admiradas vendo a beleza da Igreja, toda ataviada com as riquezas da graça de Cristo. Mas a Igreja não se sentiu feliz recebendo esta admiração; as “filhas” devem estar contemplando a perfeição maior, Jesus Cristo, aquele que faz os seus redimidos tão aprazíveis. Neste texto, o nome e a glória de Salomão são usados para representar aquele que é infinitamente “maior do que Salomão” Mt.12:42. Veja a descrição profética de Cristo no Salmo 72:17. “Subsista para sempre o seu nome e prospere enquanto resplandecer o sol; nele sejam abençoados todos os homens e as nações lhe chamam bem-aventurado”. Por isso, a Igreja é exortada para “olhar firmemente para o Autor e Consumador da fé”, pois “Deus o exaltou sobremaneira e lhe deu o nome que está acima de todo nome, para que ao nome de Jesus se dobre todo joelho, nos céus, na terra e debaixo da terra, e toda língua confesse que Jesus Cristo é Senhor, para glória de Deus Pai” Fl.2:9-11. A beleza da Igreja não pode ofuscar a beleza superior do seu Senhor e Sustentador. Para que os olhos das “filhas de Jerusalém” sejam redirecionados, a Igreja passa a descrever a infinita superioridade de Cristo através do uso de três figuras alegóricas: a sua liteira; o seu palanquim; e a sua coroa.

a) A liteira, Vs,7-8. (espécie de cadeirinha coberta, sustentada por dois longos varais e conduzida por duas bestas ou dois homens, um colocado à frente e outro colocado atrás; feita para uma só pessoa, por exemplo, quando o rei fazia visitas de reconhecimento, etc.). Estas explicações que a Igreja deu às “filhas de Jerusalém” estão repletas de alegorias que exigem uma interpretação que evidencie o temor do Senhor. As glórias incomparáveis de Cristo ultrapassam os limites de uma linguagem corriqueira, por isso, como em outras partes da Bíblia, o Espírito Santo é servido em usar as palavras sugestivas e imaginativas da poesia.

I) Como o Rei se apresenta a seus súditos. “É a leiteira de Salomão”. Esta frase pode ser entendida como um tipo de exclamação: Veja, preste atenção e se maravilhe diante desta cena: É a liteira de Salomão; ou seja, a vinda do Rei do reis, Jesus Cristo, em toda a sua majestade e potência! Durante os seus dias aqui na terra, Cristo foi visto em seu estado de humilhação, “pois ele, subsistindo em forma de Deus, não julgou como usurpação o ser igual a Deus; antes, a si mesmo se esvaziou, assumindo a forma de servo, tornando-se em semelhança de homens; e reconhecido em figura humana, a si mesmo se humilhou, tornando-se obediente até a morte e morte de cruz”. Mas Ele não está mais neste estado de humilhação. Ele tem que ser contemplado e adorado como Ele está agora, em seu estado de exaltação. “Pelo que também Deus o exaltou sobremaneira e lhe deu o nome que está acima de todo nome, para que ao nome de Jesus se dobre todo joelho, nos céus, na terra e debaixo da terra, e toda língua confesse que Jesus Cristo é Senhor, para glória de Deus Pai” Fl.2:5-11. Quando Jesus se dirigiu às sete Igrejas da Ásia, Ele se apresentou na glória da sua exaltação. “Não temas; eu sou o primeiro e o último e aquele que vive; estive morto, mas eis que estou vivo pelos séculos dos séculos e tenho as chaves da morte e do inferno” Ap.1:17-18. Ele se apresenta como o Soberano que conhece as nossas obras e como aquele que tem o direito de ordenar a vida de seu povo. Temos que entender com quem estamos lidando. Ele é muito mais do que um mero homem.

II) Os valentes do Rei. “Sessenta valentes estão ao redor dela (da leiteira onde Cristo está assentado), os valentes de Israel”. Estes valentes representam a liderança da Igreja, pois pesa sobre eles a responsabilidade de estar em plena comunhão com Cristo, cuidando de todos os seus interesses. Quando Ele subiu à destra de Deus, em glória, “concedeu dons aos homens”, isto é, “ele mesmo concedeu uns para apóstolos, outros para profetas, outros para evangelistas e outros para pastores e mestres, com vistas ao aperfeiçoamento dos santos para o desempenho de seu serviço, para a edificação do corpo de Cristo” Ef.4:7-12. Estes homens valentes de Cristo são destacados porque estão sempre andando ao lado de seu Mestre, demonstrando a sua fidelidade e regozijando-se nas “riquezas da sua glória” Rm.9:23. Contudo, mesmo mantendo esta comunhão espiritual com Cristo, eles não ficam isentos dos receios espirituais que assediam os servos de Deus. O Ap. Paulo confessou aos Coríntios: “E foi em fraqueza, temor e grande tremor que estive entre vós” 1 Co.2:3. Muitas vezes, os ministros precisam receber uma lembrança da sua responsabilidade para cumprir os termos de seu chamamento. “Também dizei a Arquipo: atenta para o ministério que recebestes no Senhor, para o cumprires” Cl.4.17. De modo semelhante, Timóteo foi exortado: “Tu, porém, sê sóbrio em todas as coisas, suporta as aflições, faze o trabalho de um evangelista, cumpre cabalmente o teu ministério” 2 Tm.4:5. Por isso, o Apóstolo fez um apelo a cada um dos membros da Igreja: “Orai por nós, pois estamos persuadidos de termos boa consciência, desejando em todas as coisas viver dignamente” Hb.13:18. E o Ap. Paulo acrescentou: “E também (orai) por mim; para que me seja dada, no abrir da minha boca, a palavra, para, com intrepidez, fazer conhecido o mistério do evangelho” Ef.6:19. 

III) O armamento destes valentes. “Todos sabem manejar a espada e são destros na guerra; cada um leva a espada à cinta”. A espada é uma arma de guerra, e serve, não apenas na defensiva, para proteção contra os ataques do inimigo, mas, também, na ofensiva, quando o soldado tem que atacar, a fim de entrar e tomar posse do território do inimigo. Em termos espirituais, esta espada é Palavra de Deus Ef.6:17. O Apóstolo, descrevendo a suficiência deste recurso, afirma que ela é muito superior a qualquer espada de aço. “Porque a Palavra de Deus é viva, e eficaz, e mais cortante do que qualquer espada de dois gumes, e penetra até ao ponto de dividir alma e espírito, juntas e medulas, e é apta para discernir os pensamentos e propósitos do coração” Hb.4:12. Os servos do Rei Jesus Cristo não precisam de nenhum outro armamento além da Bíblia Sagrada, porque ela é o que Cristo lhes deu para cuidar de seus interesses aqui na terra. O Ap. Paulo, descrevendo a suficiência desta providência divina, afirma: “Porque as armas da nossa milícia não são carnais e sim poderosas em Deus, para destruir fortalezas; anulando nós, sofismas e toda altivez que se levanta contra o conhecimento de Deus, e levando cativo todo pensamento à obediência de Cristo” 2 Co.10:4-5. O texto de Cantares afirma que estes valentes do Rei “sabem manejar a espada e são destros na guerra”. Neste mesmo espírito, o Ap. Paulo encorajou a Timóteo: “Procura apresentar-te a Deus aprovado, como obreiro que não tem de que se envergonhar, que maneja bem a palavra da verdade”  2Tm.2:15. Os pregadores da Palavra de Deus são despenseiros, e o que se requer deles é que cada um seja encontrado fiel, 1 Co.4:2. O dever principal deles é proclamar as sublimidades de Cristo, e quando isto acontece, Cristo se torna o mais desejado entre as opções deste mundo. 

IV) O serviço destes valentes. Proteger e fortalecer os membros particulares da Igreja, “por causa dos temores noturnos”. Estes temores noturnos são, até certo ponto, justificados, porque, durante a noite, nas trevas, os poderes do maligno costumam se manifestar com maior intensidade. “A nossa luta não é contra o sangue e a carne e sim contra os principados e potestades, contra os dominadores deste mundo tenebroso, contra as forças espirituais do mal nas regiões celestiais” Ef.6:12. É durante a noite que os pecadores costumam praticar as suas perversões. Estes valentes do Rei têm a responsabilidade de não somente lutar contra este “império das trevas”, libertando os cativos através da pregação do evangelho, mas, também, ensinar os libertados a andar “como filhos da luz” Cl.1:13; Ef.5:8.

Não convém subestimar a realidade e o poder destas trevas. “Sede sóbrios e vigilantes. O diabo, vosso adversário, anda em derredor, como leão que ruge, procurando alguém para devorar” 1 Pe.5:8. Este inimigo da nossa alma procura tomar vantagem quando estamos física ou emocionalmente esgotados. O Senhor Jesus, “depois de jejuar quarenta dias e quarenta noites, teve fome”. O diabo, sabendo desta necessidade física, tentou induzir Jesus a usar seus poderes milagrosos erradamente, a fim de saciar a sua fome. Nesta ocasião, o tentador foi derrotado quando Jesus declarou a sua total obediência ao que está legislado nas Escrituras Sagradas, Mt.4:2-4. O Ap. Pedro, depois de suas experiências desorientadoras no Jardim de Getsêmani, ficou espiritualmente debilitado e, neste estado de fraqueza, o diabo usou uma criada para o tentar, e, porque ele estava totalmente despreparado, por falta de oração, caiu, negando o seu conhecimento de Jesus, Lc.22:40,55-60. Ninguém é tão forte a ponto de não ser tocado pela tentação. “Aquele, pois, que pensa estar em pé veja que não caia” 1 Co.10:12. Através do ensino das Escrituras Sagradas, estes valentes do Rei são os nossos guias durante a nossa peregrinação, rumo à cidade celestial. Portanto, devemo-lhes a nossa obediência, bem como a nossa submissão, pois velam por nossa alma, como quem deve prestar contas, para que façam isto com alegria, e não gemendo, Hb.13:17. Os temores noturnos perdem o seu domínio à medida que seguimos as orientações das Escrituras Sagradas. Antes de nos aproximarmos da Bíblia Sagrada, a fim de receber as suas instruções, devemos orar à semelhança do Salmista: “Senhor, desvenda os meus olhos para que eu contemple as maravilhas da tua lei” Sl.119:18.

b) O palanquim (semelhante à liteira, porém, maior, feito para o Rei e a sua esposa). O assunto continua sendo Cristo, quem Ele é, e o que Ele faz. Nestes versículos, o nome de Salomão é usado três vezes, observando uma graduação em sua majestade. Primeiro “Salomão”, sem qualquer acréscimo; depois, “o rei Salomão”, esta pessoa tão vistosa é um rei; e, finalmente, “o rei Salomão com a coroa”, ele é um rei que tem um reino onde ele é o aclamado soberano. Ao estudarmos a vida daquele que é imensuravelmente maior do que Salomão, o Senhor Jesus Cristo, descobrimos que Ele sofreu uma degradação antes de sua graduação. No dia da sua encarnação, foi cercado pelos louvores das milícias celestiais, anunciando que este recém nascido era “o Salvador, que é Cristo, o Senhor” Lc.2:8-14. Mais tarde, “ouviu-se uma voz do céu (a do Pai): Tu és o meu Filho amado, em ti me comprazo” Lc.3:21-22. Mas, a partir daquele momento, Ele experimentou uma degradação incrivelmente assustadora e injustificável, em termos humanos. Era homem de dores e que soube o que é padecer; e, como um de que os homens esconderam o rosto, era desprezado e maltratado de tal forma que a Bíblia tem este registro: “Como pasmaram muitos à vista dele (pois o seu aspecto estava mui desfigurado, mais do que o de outro qualquer, e a sua aparência, mais do que a dos outros filhos dos homens)” Is.52:14; 53:3. E, finalmente, “Ele próprio, carregando a sua cruz, saiu para o lugar chamado Calvário, Gólgota em hebraico, onde o crucificaram” (num dado momento, Jesus, tão enfraquecido, e, por não suportar mais o peso do madeiro, teve a cruz carregada por Simão, o cireneu), Jo.19:17; Lc.23:26. Mas, depois de ser morto e sepultado, Deus o ressuscitou “dentre os mortos e o fez sentar à sua direita nos lugares celestiais, acima de todo principado, e potestade, e poder, e domínio e de todo nome que se possa referir não só no presente século, mas também no vindouro” Ef.1:20-21. E, de lá, Deus “o exaltou a Príncipe e Salvador, a fim de conceder a Israel (e aos povos gentílicos) o arrependimento e a remissão dos pecados” At.5:31. Primeiro, a degradação, por causa dos nossos pecados; e, depois, a graduação, por causa da nossa justificação, Rm.4:24-25. Ah, se pudéssemos contemplar o Senhor Jesus Cristo vestido com a glória de suas incontáveis perfeições, o nosso culto seria bem mais expressivo, e, com o Ap. Paulo, exclamaríamos: “Não que eu o tenha já recebido ou tenha já obtido a perfeição; mas para conquistar aquilo para o que também fui conquistado por Cristo Jesus” Fl. 3:12. O anseio do Ap. Paulo deve ser também o nosso: perfeitos, totalmente conformes a imagem de Jesus Cristo. Eis o desafio irresistível que as “filhas de Jerusalém” receberem: para conhecer as sublimidades de Jesus Cristo e as plenitudes da salvação que Ele oferece, gratuitamente, a todos que o buscam pela fé.

I) O fabricante deste palanquim. “O rei Salomão fez para si um palanquim”. Ele o fez para a sua esposa também, pois o palanquim foi construído para transportar duas ou mais pessoas. A figura descreve Cristo e a sua Igreja, que anda com Ele em plena comunhão espiritual. Cristo está arrebanhando o seu próprio povo “para apresentar a si mesmo Igreja gloriosa, sem mácula, nem ruga, nem coisa semelhante, porém, santa e sem defeito” Ef.5:27. Cristo “está edificando a sua Igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela” Mt.16:18. Esta obra se realiza mediante a pregação do evangelho e Ele reina como “Senhor dos senhores e Rei dos reis” sobre todos aqueles que crêem, Ap.17:14. Jesus Cristo e a sua Igreja estão inseparavelmente unidos, presos por um jugo espiritual, e, desta maneira, andam juntos com passos harmoniosos. Ele é o Redentor e Sustentador da sua Igreja. Cristo ama o seu povo, pois, pelo próprio sangue o libertou de seus pecados e da sentença da morte eterna. Ao meditar sobre estas verdades, reconhecemos e confessamos que fomos comprados por preço altíssimo, por isso, com coração agradecido, desejamos, ardentemente, glorificá-lo em todas as áreas do nosso procedimento, tanto em palavras, como também em ações, 1 Co.6:20; Cl.3:17. 

II) Os materiais usados na feitura do palanquim. “Madeira de Líbano. Fez-lhe as colunas de prata, a espalda de ouro, o assento de púrpura”. Os materiais usados para fabricar este palanquim são de grande valor por causa da sua longa durabilidade. O Templo em Jerusalém, que merecia o melhor de tudo, recebeu grande quantidade de madeira de Líbano, prata, ouro e púrpura. Estas preciosidades podem embelezar o que é material, porém, não podem redimir a alma de ninguém e nem adquirir a sua salvação. Estas figuras representam o preço incalculável que tinha que ser pago a fim de redimir e salvar o povo que pertence a Cristo Jesus. O Ap. Pedro, ao meditar sobre o valor pago para adquirir a eterna salvação de pecadores, escreveu: “Sabendo que não foi mediante coisas corruptíveis, como prata ou ouro, que fostes resgatados do vosso fútil procedimento que os vossos pais vos legaram, mas pelo precioso sangue, como de cordeiro, sem mácula e sem defeito, o sangue de Cristo” I Pe.1:18-19.

O palanquim, que foi construído por Cristo, descreve como Ele sustenta o seu povo. A madeira de Líbano, conhecida por sua incorruptibilidade, representa a Palavra incorruptível de Deus. Cristo disse: “Passará o céu e a terra, porém, as minhas palavras não passarão”, duram para sempre, Mt.24:35. Elas têm essa qualidade por causa da sua origem sobrenatural e foram dadas para nos alimentar espiritualmente. “Desejai, ardentemente, como crianças recém nascidas, o leite espiritual (a Palavra de Deus), para que por ele, vos seja dado crescimento para salvação” 1 Pe.2:2. Cristo realiza todos os seus propósitos salvíficos mediante a pregação e o ouvir da Palavra de Deus. “A fé vem pela pregação, e a pregação, pela palavra de Cristo” Rm.10:17.

Colunas de prata. Os apóstolos “eram reputados colunas” da Igreja, porque tinham a responsabilidade de edificá-las mediante a fiel exposição da palavra de Deus, pois somente ela serve para realizar este propósito. “As palavras do Senhor são palavras puras, prata refinada em cadinho de barro, depurada sete vezes”, Sl.12:6. “São mais desejáveis do que ouro, mais do que ouro depurado” Sl.19:10.

A espalda, ou, o encosto de ouro. A Palavra de Deus é de valor inestimável, cheia de promessas preciosas e infalíveis. “Porque quantas são as promessas de Deus, tantas têm nele o sim; porquanto também por ele é o amém para glória de Deus, por nosso intermédio” 2 Co.1:20. Sim, podemos encostar e descansar sobre esta estrutura de ouro. Cristo prometeu: “Na casa de meu Pai há muitas moradas. Se assim não fora, eu vo-lo teria dito. Pois vou preparar-vos lugar. E quando eu for e vos preparar o lugar, voltarei e vos receberei para mim mesmo, para que, onde eu estou, estejais vós também” Jo.14:2-3. Assim, neste palanquim que Cristo construiu para si e para a sua Igreja, podemos peregrinar com toda segurança, pois somos o seu povo precioso, sustentado por suas mãos, e de onde jamais seremos arrebatados por forças alheias. Esta é a base da nossa salvação e vida eterna.

III) A ornamentação do palanquim. “É tudo interiormente ornado com amor pelas filhas de Jerusalém”. Aqui nós vemos a verdadeira espiritualidade do Livro Cântico dos Cânticos. Este palanquim que Cristo fez para si e para a sua Igreja não é ornado com belezas materiais, antes, o seu enfeite é espiritual. O amor é sempre direcionado para pessoas específicas, aos perdidos deste mundo, aqueles que ainda precisam ter um encontro salvífico com Jesus Cristo. Sim, Ele ama a seu povo redimido, contudo, este amor não se limita àqueles que já crêem, Ele ama também as “filhas de Jerusalém”, aquelas que vierem a crer em seu nome por intermédio da pregação do evangelho, Jo.17:20. Cristo expressou esta verdade, dizendo: “Ainda tenho outras ovelhas, não deste aprisco (os judeus); a mim me convém conduzi-las; elas (os gentios) ouvirão a minha voz; então haverá um rebanho (judeus e gentios) e um pastor” Jo.10:16; Ef.2:11-22.

Neste palanquim, de onde emana o amor de Cristo, somos convidados a entrar e a experimentar esta delícia, respirar o seu aroma, andar nele e descansar nele. “O amor jamais acaba”. É o amor que faz as sublimidades de Cristo tão aplicáveis às nossas necessidades espirituais. Se o ouro do palanquim não estivesse coberto com amor, seria impossível desfrutar de uma comunhão espiritual com Cristo. O amor e a graça que Cristo derrama sobre nós são tão revigorantes que o crente, embora pecador e imperfeito, pode descansar nele.

Devemos nos lembrar do contexto destas descrições. As “filhas de Jerusalém” fizeram uma pergunta à Igreja: “Que é isto que sobe do deserto?” A Igreja, usando uma linguagem alegórica, está respondendo, descrevendo as preciosidades de Jesus Cristo, fazendo-o desejável.

c) A coroa. Ela é o símbolo de realeza. “Vemos, todavia, aquele (Cristo) que, por um pouco, tendo sido feito menor que os anjos (pela encarnação), Jesus, por causa do sofrimento da morte, foi coroado com glória e honra (por causa da sua vitória pela cruz do Calvário), para que pela graça de Deus, provasse a morte por todo homem” Hb.2:9.

I) O desafio que as “filhas de Jerusalém” receberam. “Saí, ó filhas de Sião, e contemplai ao rei Salomão com a coroa”. Estas palavras são semelhantes à exortação que Natanael recebeu quando Filipe estava testificando do seu encontro com o Cristo. “Vem e vê”. Não adianta ficar aqui levantando objeções. Vem e vê por si mesmo e todas as suas dúvidas serão dissipadas. Um encontro pessoal com Cristo desfaz todas as objeções que a incredulidade pode sugerir. A Bíblia insiste na necessidade de uma ação da nossa parte. “Olhai para mim e sede salvos, vós, todos os termos da terra; porque eu sou Deus, e não há outro” Is.45:22. Quando os filhos de Israel ficaram prostrados e moribundos no deserto, por causa de picadas por serpentes abrasadoras, foram exortados a levantarem os olhos e a acreditarem na providência de Deus. A Bíblia registra: “Fez Moisés uma serpente de bronze e a pôs sobre uma haste; sendo alguém mordido por alguma serpente, se olhava para a de bronze, sarava” Nm.21:4-9. E, todos os mordidos que recusaram a reagir e a levantar os seus olhos pela fé na providência divina, morreram por causa de sua incredulidade. “E do modo por que Moisés levantou a serpente no deserto, assim importa que o Filho do homem seja levantado (e crucificado), para que todo o que nele crê, tenha a vida eterna” Jo.3:14-15.

Mas devemos observar que as “filhas de Jerusalém” são encorajadas a contemplar algo específico: “contemplai ao rei Salomão (Cristo) com a coroa”. É necessário contemplar e acreditar na veracidade dos dois coroamentos de Cristo e discernir o sentido espiritual de cada um.

Na sua humilhação, Ele foi coroado com o símbolo de ultraje. “Tecendo uma coroa de espinhos puseram-lha na cabeça, e, na mão direta, um caniço; e ajoelhando-se diante dele, o escarneciam, dizendo: Salve, rei dos Judeus!”. Mt.27:29. Esta coroa, juntamente com todos os demais atos de crueldade, representava a maldade do pecado que caiu sobre Ele. “Sabeis também que Ele (Cristo) se manifestou para tirar os pecados, e nele, não existe pecado” 1 Jo.3:5. O nosso pecado foi removido de sobre nós através de um ato de imputação (transferência), “O Senhor fez cair sobre Ele a iniqüidade de nós todos” Is.53:6. “Aquele (Jesus Cristo) que não conheceu pecado Ele (o Senhor Deus e Pai) o fez pecado por nós; para que nele, fôssemos feitos justiça de Deus” 2 Co.5:21. A nossa contemplação da Pessoa de Cristo deve produzir em nós uma declaração de fé na suficiência do sofrimento substitutivo de Jesus Cristo. “Ele me amou e a si mesmo se entregou por mim” Gl.2:20.

Na sua glorificação, Ele foi coroado com uma coroa de vitória. Ele é o Senhor dos senhores e o Rei dos reis, Ap.19:16 com Dt.10:17. Depois da sua ressurreição e ascensão, Cristo foi exaltado a Príncipe e Salvador a fim de conceder a seu povo o arrependimento e a remissão dos pecados e, no Livro de Apocalipse, vemos que “foi-lhe dada uma coroa; e Ele saiu vencendo e para vencer”. At.5:31; Ap.6:2 Depois da sua humilhação, “Deus o exaltou sobremaneira e lhe deu o nome que está acima de todo nome, para que ao nome de Jesus, se dobre todo joelho, nos céus, na terra e debaixo da terra, e cada língua confesse que Jesus Cristo é Senhor, para glória de Deus Pai” Fl.2:9-11. Quando Cristo apareceu para o Ap. João na Ilha Patmos, Ele se identificou dizendo: “Não temas, eu sou o primeiro e o último e aquele que vive; estive morto, mas eis que estou vivo pelos séculos dos séculos e tenho as chaves da morte e do inferno” Ap.1:17-18. É de suma importância que tenhamos uma compreensão adequada da Pessoa de Jesus Cristo exaltado, pois a nossa fé sempre revelará este entendimento. Se o conhecimento de Cristo for limitado ou deturpado, a fé agirá de acordo, uma fé inoperante; e, se este conhecimento for pleno e bíblico, a fé agirá de acordo, uma fé operante que realiza proezas para a glória de Deus. As “filhas de Jerusalém” receberam este desafio: “Contemplai o Rei”. E, no Novo Testamento, temos esta exortação: “Considerai, pois, atentamente, aquele que suportou tamanha oposição de pecadores contra si mesmo, para que não vos fatigueis, desmaiando em vossas almas” Hb.12:3.

II) A origem desta coroa. “A coroa com que a sua mãe o corou”. Neste contexto, a “mãe” de Jesus Cristo é a Igreja do Antigo Testamento. Cristo veio ao mundo através da instrumentalidade da nação israelita, pois “a salvação vem dos judeus” Jo.4:22. Esta “mãe” é a “mulher” que deu à luz “um filho varão, que há de reger todas as nações com cetro de ferro” Ap.12:1-6. O Ap. Paulo esclareceu: “Porque convém que Ele (Jesus Cristo) reine até que haja posto todos os inimigos debaixo dos pés” 1 Co.15:25. Assim, na plenitude do tempo, Jesus Cristo, “o qual segundo a carne, veio da descendência de Davi” (da tribo de Judá, filho de Israel), entrou no mundo como “o Salvador que é Cristo, o Senhor” Rm.1:3; Lc.2:11. Quando o texto se refere à coroa com que a sua mãe o coroou, o sentido é: A Igreja reconhece e declara o senhorio absoluto de Jesus Cristo. “Deus o exaltou sobremaneira e lhe deu o nome que está acima de todo nome, para que ao nome de Jesus se dobre todo joelho, nos céus, na terra e debaixo da terra e toda língua confesse que Jesus Cristo é Senhor, para glória de Deus Pai” Fl.2:9-11.

Novamente, devemos lembrar do duplo coroamento de Cristo. Foi a liderança da Igreja visível do Antigo Testamento que, na sua incredulidade, permitiu a tecedura de uma coroa de espinhos que foi colocada sobre a cabeça de Jesus Cristo. Ela também foi a responsável por sua crucificação: “Este Jesus é a pedra rejeitada por vós, os construtores (as autoridades no Sinédrio, os anciãos, os escribas, o sumo sacerdote Anás, Caifás, Alexandre e todos os que eram da linhagem do sumo sacerdote) o qual se tornou a pedra angular” At.4:1-11. Esta rejeição era o desprezo da realeza de Cristo, pela qual declarou: “Não queremos que este reine sobre nós” Lc.19:14. Mas, por outro lado, dentro da Igreja visível, existe uma multidão incontável de crentes verdadeiros que, através de uma vida santa e irrepreensível, confessam o seu amor e lealdade à coroa celestial de Jesus Cristo. Estas pessoas são aquelas ovelhas que ouvem a voz de seu Pastor e o seguem com toda submissão e deferência, Jo.10:27.

III) O dia em que Ele recebeu esta coroa. “No dia do seu deposório, no dia do júbilo do seu coração”. Esta frase se refere à nossa união com Cristo. Ele disse: “Eu sou a videira, vós, os ramos. Quem permanece em mim, e eu, nele, esse dá muito fruto, porque sem mim nada podeis fazer” Jo.15:5. A totalidade da nossa vida espiritual depende desta união vital com Cristo. Uma das frases mais importantes no Novo Testamento, referente a esta união, é “em Cristo”, unidos com Cristo. Deus o Pai age somente através da mediação de seu Filho. Em Cristo, somos abençoados com toda sorte de bênção espiritual nas regiões celestiais. Em Cristo, fomos escolhidos para termos uma vida santa e irrepreensível. Em Cristo, fomos adotados e recebidos como filhos de Deus. Em Cristo, fomos redimidos, perdoados e selados com o Espírito Santo da promessa, o penhor da nossa herança no céu, Ef.1:3-14.

E, de igual importância, a nossa santificação e a transformação total da nossa vida dependem desta união vital com Cristo. Ele é o nosso Representante federal diante da santidade de Deus. “Porque, como, pela desobediência de um só homem (Adão), muitos se tornaram pecadores (sentenciados à pena da morte eterna), assim também, por meio da obediência de um só (Cristo), muitos se tornarão justos (feitos aceitáveis diante de Deus), Rm.5:17-19. Adão era o nosso representante e, o que ele fez em seu ato de prova (pois ele tinha que manifestar a sua obediência incondicional a seu Criador), repercutiu sobre toda a sua descendência. Ele falhou nesta prova de obediência, portanto, a morte caiu sobre ele e sobre toda a sua descendência natural. E, de modo semelhante, Cristo, como o Representante federal dos eleitos, manifestou submissão à vontade de seu Pai através de uma obediência imaculada aos preceitos da lei divina. Por isso, os méritos desta obediência repercutem sobre todo o seu povo. Em termos práticos, quando Cristo morreu, Ele morreu para o pecado, destituindo-o de seu poder. E nós, unidos com Cristo, também morremos, com Ele, para o pecado, o seu domínio sobre nós foi destituído de sua tirania. Por isso, o Apóstolo podia exortar: “Assim também vós considerai-vos mortos para o pecado, mas vivos para Deus, em Cristo Jesus”, acrescentando: “Porque o pecado não terá domínio sobre vós, pois não estais debaixo da lei (que não tem poder para amortecer as paixões da carne), e sim da graça” (pela qual recebemos forças para vencer a tentação, para a glória de Deus), Rm.6:1-14.

O nosso texto fala de um dia de júbilo, um dia que faz o coração de Cristo transbordar de alegria. Indubitavelmente, este dia se refere ao dia da conversão de um pecador, quando ele deixa os seus pecados a fim de servir ao Deus vivo e verdadeiro, 1 Ts.1:9. Cristo afirmou que há grande júbilo no céu quando um pecador se arrepende e abandona os seus pecados a fim de seguir nas pegadas de seu Salvador e Senhor, Lc.15:3-10. Podemos sentir a grande alegria que Cristo sentiu ao contemplar a incontável multidão de seus redimidos, tições arrebatados da fogueira: “Pois aqui estou eu e os filhos que Deus me deu” Am.4:11; Hb.2:13. Quando o pródigo voltou para a sua casa, o pai confessou ao filho mais velho: “Era preciso que nos regozijássemos e alegrássemos, porque este o teu irmão estava morto e reviveu, estava perdido e foi achado” Lc.15:32. Que cada um de nós seja motivo de júbilo no coração de Jesus Cristo.

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